sábado, 31 de março de 2007

Sábado de noite

Joanne Harris - minha escritora favorita!


Joanne Harris

comendo chocolate, hein!

De todos os livros dela lançados no Brasil, só não li mesmo um que se passa na ortodoxia cristã da França medieval. Acho que se chama os Saltimbancos. É isso. Quando vi que tinha freira no meio fiquei meio desanimada! Bom, ortodoxia não é muito com a Harris, mas mesmo assim ...
Não sou muito de livro ou filme de 'época' - 'século XVIII', principalmente francês -, a 'atmosfera' pesa, a linguagem é encroada, passa muito pano na minha frente o tempo todo, e a etiqueta é um saco. Me pareceu que esse seria inevitavelmente um livro chato. Muita pesquisa pra pouca emoção. Fiquei receosa de perder o encanto dos outros livros. A magia está sempre rodeando os personagens da Harris. Tem um tom de fábula quando ela escreve, que eu gosto, e fiquei com medo de perder isso. Mas, vou acabar lendo esse tal aí, só pelo estilo dela. E também por querer ler todos os seus livros. Eu jurei que um dia eu ia ler todos os livros de um autor, e ela foi a eleita! Ainda que odeie, um ou outro! Já tentei isso com Machado de Assis (!) mas não deu muito certo!!
O Segredo das Marés (COASTLINERS) e os Cinco Quartos da Laranja: os de que mais gostei. É uma característica dela falar do passado no presente. E acontece também de um personagem sair de uma história e passar pra outra (passa de um livro pro outro numa outra história, entende?). A gente leva um susto! Ou é uma história que não tomou determinado rumo da primeira vez e no livro seguinte ela dá um outro desfecho pra ela. É um barato! O personagem não morre com a história. E a história nunca acaba também! Isso é fantástico. É um dejá vu esquisito! Em Cinco Quartos da Laranja ela vai parar na Segunda Guerra Mundial no meio de um bando de ciganos. Já em Vinho de Amoras correm duas histórias paralelas, sem que uma tenha nada a ver com a outra. Numa um garoto passa a infância, entre umas férias e outras, na convivência de um velho desconhecido, de quem se torna amigo por seu amor às frutas do pomar, com que faz seus licores e vinhos caseiros. O menino fica ali aprendendo. Outra, um jovem homem com uma vida muito previsível resolve dar uma guinada mudando de cidade, largando a namorada, abrindo mão da segurança da família e do emprego pra ir em busca da casa dos seus sonhos, que viu num anúncio. Quando chega lá é uma casa caindo aos pedaços com um vinhedo todo arregaçado, e ainda aparece uma mulher com uma filha pra atazanar a vida dele, dizendo que a casa é dela. Rola um romance, é claro, no meio de muita parreira! Olha só o enredo naive! E eu gosto disso! Literatura nada exigente, mas uma delícia de ler! É que ela toca na minha sinestesia com sua literatura gastronômica e no meu lado pisciano da magia, dos encantamentos, das superstições, das crendices, dos surtos oníricos, dos presságios, e universos fantasiosos.
eu!

Nossa Senhora das Graças

foto: Flávia
Imagem de Nossa Senhora das Graças
Localização: Santuário/Urucânia
Foto: Flávia
escultura de Nossa Senhora das Graças na colina
próxima ao Santuário
foto: Flávia
procissão do dia da festa (27/11/05)





Nossa Senhora das Graças


localização: altar-mor da capela das aparições


rue du Bac, Paris

Devoção do povo português a Nossa Senhora



A iconografia de Nossa Senhora e suas fases


A imagem encontrada é essa ... ver descrição








"A história da pequena imagem de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, encontrada no rio Paraíba há 283 anos... Ela é a nossa Mãe e Rainha. Nunca abandona os seus filhos, procurando sempre meios e modos para revelar-se, a fim de que cada um possa acolher as suas mensagens, e através delas converter-se ao seu Filho Jesus. O que mais me chama a atenção é o seu amor exclusivo, maternal, por cada um, não excluindo ninguém. Podemos perceber isso também em suas aparições reconhecidas pela Igreja, como em Fátima, Guadalupe e em Lourdes. Para ser melhor compreendida Ela faz-se “um” conosco, adaptando as suas características físicas ao vidente, ou a um povo. Assim aconteceu também aqui, quando encontraram a sua imagem no rio Paraíba. Em sua tonalidade escura, quer identificar-se com o povo brasileiro em suas características raciais. Naquele momento histórico da escravidão, Maria surgiu como Rainha em forma de escrava, para que os escravos se tornassem livres".






Nossa Senhora Aparecida






HISTÓRIA DA IMAGEM
"A história de Nossa Senhora da Conceição Aparecida tem seu início pelos meados de 1717, quando chegou a notícia de que o Conde de Assumar, D.Pedro de Almeida e Portugal , Governador da Província de São Paulo e Minas Gerais, iria passar pela Vila de Guaratinguetá, a caminho de Vila Rica, hoje cidade de Ouro Preto - MG. Convocado pela Câmara de Guaratinguetá, os pescadores Domingos Garcia, Filipe Pedroso e João Alves saíram a procura de peixes no Rio Paraíba. Desceram o rio e nada conseguiram. Depois de muitas tentativas sem sucesso, chegaram ao Porto Itaguaçu. João Alves lançou a rede nas águas e apanhou o corpo de uma imagem de Nossa Senhora da Conceição sem a cabeça. Lançou novamente a rede e apanhou a cabeça da mesma imagem. Daí em diante os peixes chegaram em abundância para os três humildes pescadores.
Durante 15 anos seguidos, a imagem ficou com a família de Felipe Pedroso, que a levou para casa, onde as pessoas da vizinhança se reuniam para rezar.A devoção foi crescendo no meio do povo e muitas graças foram alcançadas por aqueles que rezavam diante a imagem. A fama dos poderes extraordinários de Nossa Senhora foi se espalhando pelas regiões do Brasil. A família construiu um oratório, que logo tornou-se pequeno. Por volta de 1734, o Vigário de Guaratinguetá construiu uma Capela no alto do Morro dos Coqueiros, aberta à visitação pública em 26 de julho de 1745. Mas o número de fiéis aumentava, e, em 1834 foi iniciada a construção de uma igreja maior (atual Basílica Velha). No ano de 1894, chegou a Aparecida um grupo de padres e irmãos da Congregação dos Missionários Redentoristas, para trabalhar no atendimento aos romeiros que acorriam aos pés da Virgem Maria para rezar com a Senhora "Aparecida" das águas".




Eu tenho essa história contada pela Fiinha (foto abaixo), gravada numa fita. Não deu pra transcrevê-la aqui porque estou sem gravador, mas, vou providenciar. Saudade dela! Ela é ex-madrinha do congado de Caranaíba, um grupo que sai também em Cristiano Otoni, na época fora da festa. É uma devota de Nossa Senhora Aparecida que sai ao lado do capitão Vicente. Ele levando o mastro da santa nos dias de festa.
Foto: Flávia
Mas, vou deixar o refrão de uma cantiga dedicada a Nossa Senhora que ela cantou pra mim. Custou a lembrar no início, tava enferrujada a cantiga, sem uso. Numa outra apareceu também muito a confusão com as palavras (pronúncia e significado): umas eram ininteligíveis mesmo, de tanto que o português tinha sido revirado na língua nativa africana (ainda usada pelos cantadores, ela garantiu). Aí tinha briga com a filha que é a madrinha atual, de como que era a letra do verso mesmo, e como era pronunciada. No final não tinha muito consenso! O divertido foi ver esse bate-boca enquanto a Fiinha passava um café pra gente na cozinha simples e apertada. Ela ali em pé, indo e vindo, eu e a filha e a sobrinha, sentadas à mesinha perto do fogão. E gente chegando! Cachorro ia, cachorro vinha, a porta da cozinha aberta pro quintal, com cheirinho de mato entrando do monte de planta com nomes na ponta-da-língua pra todas! A que mais fiquei xodó foi a 'chinelinho virado', e é mesmo, é que nem um chinelinho virado, uma coisa! Não aguentei de rir, e outros tantos nomes engraçados. Foi uma piada!
Pena que não tem som aqui!
"Ô beija-flor toma conta do jardim
Ô beija-flor toma conta do jardim
Vou mandá Nossa Senhora vim tomá conta de mim
Vou mandá Nossa Senhora vim tomá conta de mim"


Todo ano meu pai vai à procissão de Aparecida do Norte. Mas, ele é devoto mesmo é de São Judas Tadeu! Já tem uns anos que ele só faz promessa pra eu arranjar emprego! Coitado.




Culto de Nossa Senhora de Nazaré



"O culto de Nossa Senhora de Nazaré - O culto à Virgem de Nazaré teve origem em Portugal. No Pará, conta a história que foi um homem simples, de nome Plácido, morador na estrada de Utinga, o primeiro devoto da Santa. Plácido rezava todos os dias frente a uma imagem encontrada num tronco de madeira, no meio da floresta, durante uma caçada. Era um taperebazeiro. Em outubro de 1700, Plácido encontrou a imagem vestida de escarlate e azul, sustentando nos braços um menino a brincar com um globo. Examinando a imagem, descobriu alguns papéis costurados no forro da manta e ficou sabendo que aquela era uma cópia de Nossa Senhora venerada em Portugal, na Vila de Nazaré, próximo a Leiria, na Província de Extremadura.
Plácido levou a imagem para sua casa e chamou os amigos para rezarem, dando início à devoção da Virgem. No dia seguinte, foi surpreeendido com o desaparecimento da imagem. Triste, voltou para o trabalho, acabando por encontrar a Santa novamente no pé do taperebazeiro. Novamente trazida para a choupana, outra vez fugiu para a floresta. Assim começou a surgir a história dos milagres".

O outro pé da sereia (Mia Couto)



As lendas por trás das aparições milagrosas de imagens de Nossa Senhora em beiradas de rios são instigantes do ponto de vista da imaginação. Em Portugal e suas ex-colônias a origem de muitas das devoções a santos têm como ponto de partida esses relatos orais imaginários cheios de sincretismo religioso em que a festa, o santuário, a romaria ganharam dia próprio de comemoração em homenagem ao santo.

***** Mnemo-virtu (Renata La Rocca) "Estruturas e Processos"

Imagens e lugares
A relação entre ‘imagens e lugares’, provém da
mnemônica grega que, segundo Jacques Le Goff
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precisando o caráter ativo dessas imagens no
processo de rememoração [imagens agentes]”.
O uso dessas técnicas da mnemônica grega era
bastante recorrente, relacionando, muitas vezes,
as imagens a lugares arquitetônicos, como na
􀁇􀁈􀃀􀁑􀁌􀁯􀁭􀁒􀀃􀁐􀁑􀁈􀁐􀁻􀁑􀁌􀁆􀁄􀀃􀁇􀁈􀀃􀀴􀁘􀁌􀁑􀁗􀁌􀁏􀁌􀁄􀁑􀁒􀀏􀀃􀁔􀁘􀁈􀀃􀁉􀁄􀁝􀁌􀁄􀀃􀁄􀀃
associação de conteúdos a lugares arquitetônicos.
Quintiliano desenvolveu um sistema de
informação, onde instruía o usuário a percorrer

os cômodos de um prédio mentalmente, para que
fosse capaz de recordar os conteúdos [imagens,
textos]
que deveriam ter sido previamente
associados àqueles cômodos [lugares].
Essa abordagem relacionando imagens e lugares
é também conhecida como ‘método de loci’.
Através desse método, seria possível construir
um sistema-espaço mental como forma de
estruturar um conhecimento que se quisesse
recordar ou adquirir, dependendo do caráter
da proposição desse sistema. Muitos desses
modelos de memorização espacial, utilizados
desde a antiguidade clássica até o século XVII
(Renascença e Idade Média),
foram abandonados e esquecidos, sobretudo em
função do desenvolvimento de outros meios de
comunicação, como a imprensa, por exemplo.
Posteriormente, alguns autores tentaram
retomar alguns conceitos da ‘arte da memória’,
como é o caso de Leibniz [1646-1716] que, no
barroco, buscou referências no sistema Luliano
medieval
para pensar a sua ‘ars combinatória’,
que fazia referência à combinação da informação
como forma de geração de conhecimento
(...) Camillo idealizou o projeto de um Teatro da Memória
que, como descreve Frances Yates [7], baseavase
nos princípios da ciência mnemônica clássica,
com uma representação do universo, passando
pelas diversas fases da criação, modelo de teatro
descrito por ele em seu livreto’ Idea del teatro’,
publicado depois de sua morte. Construiu um
modelo desse teatro da memória, uma estrutura
de madeira que foi exibida em Veneza e Paris".

Esse povo é enjoado demais. Complica as coisas, 'requinta' só pra falar que tá falando uma coisa diferente. Ô nojo!

****** Imaginário, desequilíbrios sociais e modelos de ordem: as representações de entidades espirituais na Idade Média Feudal

Los santos fallidos y los olvidados. Los "venerables" contemporáneos de Sor Juana

Bem próximo do caso de Urucânia

Devoções populares no Brasil: contextualizando algumas obras das ciências sociais

Para uma teologia do milagre

***** Paraíso versus inferno: a visão de Túndalo e a viagem medieval em busca da salvação da alma

"***** A salvação na Idade Média estava ligada à idéia de viagem. O homem medieval se via como um viajante (homo viator), um caminhante entre dois mundos: a terra efêmera, lugar das tentações e o Paraíso, Reino de Deus e dos seres celestiais. Se o homem conseguisse manter o corpo puro conseguiria a salvação. Se falhasse, sua alma seria condenada, com castigos eternos no Inferno ou provisórios no Purgatório. Era um paradoxo da Idade Média que a alma pudesse ser salva somente pelo corpo, devido à esse sentimento de culpa, proveniente do Pecado Original. Caso o maculasse, sua alma sofreria a danação com castigos eternos no Inferno ou provisórios no Purgatório. Devido a este sentimento de culpa a população buscava a salvação através de uma viagem, como, por exemplo, as peregrinações para atingir a Terra Santa (Jerusalém). Estes deslocamentos eram inseguros (estradas ruins, ameaças de assalto e de doenças) e vistos como uma forma de salvação, na medida em que o peregrino nunca sabia com certeza se iria voltar ou não. Ele desejava sentir em seu corpo o que Cristo e os outros mártires haviam sofrido. Outro meio de salvação era o isolamento do resto da sociedade em busca de uma vida dedicada a Deus, como é o caso de eremitas e monges. Devido ao seu desprezo pelos prazeres terrenos e suas vidas consagradas às orações e jejuns a Deus, eram considerados os mais puros da sociedade terrestre. Os monges beneditinos escreveram Visões com o objetivo de apresentar os castigos e os deleites das almas no Além. Sua intenção era mostrar aos fiéis as normas de comportamento adequado para se atingir a Salvação. Os exempla, como a Visão de Túndalo, mostram os tipos de castigo com base nos sete pecados capitais e as ações para se atingir o Paraíso: dar esmolas, freqüentar missas, dar bens à Igreja e evitar a luxúria. Um elemento comum das visões é a ênfase nas sensações dos órgãos dos sentidos. Por exemplo, fedor no Inferno e perfume no Paraíso. Torturas são explicitadas através de escuridão, gritos e dores, em oposição à claridade, cantos e alegria. Na iconografia, com Os Sete Pecados Capitais, de Bosch e O Juízo Final, de Fra Angelico, a estrutura das visões se confirma. Os topos do Além, no caso do Paraíso, se caracterizam por uma paisagem edênica representada por jardins, cânticos, fontes, anjos e árvores frondosas. Já no Inferno, a geografia pressupõe alguns obstáculos, como caminhos com pontes estreitas, rios ferventes, montanhas, lagos de gelo e monstros. Assim, o indivíduo na Idade Média queria a salvação mais pelo medo do Inferno que pelas glórias do Paraíso, e a alma humana se debatia entre o desejo pelos prazeres e o pavor do abismo infernal".

***** Leitura e interpretação da piedade popular: forma e desenvolvimento da piedade popular Perspectiva histórica

3. "Como se expressa e quais são as
formas da piedade popular?
Podemos responder que são
múltiplas e diversas. Podem ser
reunidas em torno de algumas formas:
· linguagem orante: aparece nas
orações, nos cantos, nas praticas
devocionais que exprimem louvor,
agradecimento, suplica e pedido de
perdão;
· momentos celebrativos: acontecem
nas ocasiões de festa. Entre eles
podemos recordar os exercícios de
devoção ou praticas de novenas,
tríduos e coisas semelhantes;
· a ritualidade extralitúrgica e
paralitúrgica: como a representação da
via-sacra;
· os itinerários: penitencia, sobretudo
as peregrinações aos santuários;
· os gestos oblativos: formas de
promessas, ofertas. Como atos de fé e
expressões de oração-invocaçãogratid
ão, tais gestos revelam um
itinerário espiritual, uma memória;
· objetos de consagração: uso de
hábitos, escapulários, como sinal de
pertença e forma de consagração";

DEVOÇÕES POPULARES NÃO-CANÔNICAS NA AMÉRICA LATINA: UMA PROPOSTA DE PESQUISA

"RESUMO: Na América Latina ocorrem devoções populares não-canônicas que têm sido pouco estudadas no campo da Antropologia, da Psicologia Social e da Comunicação. O folclorista Felix Coluccio realizou um estudo extensivo sobre as ocorrências argentinas. No Brasil, dentre outros, há diversos estudos a respeito da devoção ao Padre Cícero e, mais recentemente, a Profa. Rosa Nava apresentou uma comunicação sobre a devoção à vítima do chamado “crime-da-mala”, ocorrente em um dos cemitérios da cidade de Santos (SP). É discutida uma tipologia para a caracterização dos “santos” não-canônicos, dos locais de devoção e das práticas comunicacionais populares. Propõe-se que a partir dos tipos identificados seja realizada uma pesquisa de base etnográfica pelos membros do Grupo de Trabalho, que permita, posteriormente, um estudo comparativo das referidas devoções e dos seus processos comunicacionais".

História da Arte: Iconografia medieval e iconografia moderna (lista de tópicos)

Testemunho e a política da memória: o tempo depois das catástrofes (Márcio Seligmann-Silva


"O trabalho enfoca diferentes aspectos do conceito de testemunho. Ele parte da noção de testemunho (martus, martur-) tal como ela pode ser lida na Orestéia de Ésquilo, no autor de Ad Herennium, em Freud e, criticamente, em Walter Benjamin. Aqui encontramos o testemunho como testis, atestação da “verdade” via visualidade. O segundo modelo de testemunho estudado é mais “auricular”, centra-se no próprio evento do testemunhar e trata dos seus limites e da sua necessidade.
Apresentam-se ainda as diferenças entre a noção de testemunho, no contexto dos estudos da Shoah e, por outro lado, dentro da teoria da literatura de “testimonio” na Hispano-América".
(...) "Após apresentar em linhas gerais duas grandes áreas de estudos do conceito nas últimas décadas, a saber, os estudos sobre a Shoah e os dedicados ao “testimonio” hispano-americano, fecho esta apresentação com uma reflexão sobre o testemunho como uma categoria que pode nos ajudar a pensar uma virada de paradigma que vem ocorrendo no campo das artes e da literatura".
04-Artg-(Marcio).p65 72 9/6/2006, 12:01

sexta-feira, 30 de março de 2007

Palavra de púlpito e erudição no século XIII: a Legenda Aurea de Jacopo de Varazze

"A partir da consideração do mais importante exemplar da hagiografia medieval, a Legenda aurea do dominicano Jacopo de Varazze, o texto pretende discorrer sobre os diversos níveis de erudição dos clérigos cristãos no século XIII e sua importância para a consideração das fontes documentais do período".

Mártires do Brasil a serem beatificados

Hagiografia SaMun

Os Mártires na 'Legenda Aurea" (Carolina Coelho Fortes/ufrj)

A religiosidade na Idade Média

Santos mais cotados como milagreiros pelos devotos!

O selvagem e a história: os antigos e os medievais (Klaas Woortmann)

"Santo Agostinho, na Cidade de Deus elabora o que é provavelmente a primeira filosofia da história escrita do Ocidente. É o primeiro passo no sentido da compreensão da evolução da humanidade como um todo, o grande projeto da Idade Média. Constituído no âmbito da interpretação teológica, tal projeto, ainda que modificado e por vezes laicizado, permaneceu vivo até pelo menos o século XIX, pois era fundamentalmente um projeto cristão".
(...)"O esforço de periodização era parte da grande ênfase posta na "história universal" destinada a determinar o fim do mundo. Se o estabelecimento de períodos já representa um pensamento histórico, implica uma temporalidade mergulhada numa percepção religiosa do mundo e voltada para o futuro. O livro de Beda é, para Whitrow (1993), o locus classicus do conceito de "idades do homem": a vida humana não transcorre num tempo contínuo, quantitativo, mas é pontuada por descontinuidades, de uma "idade" para outra.
Basicamente, trata-se, segundo Whitrow, da mesma idéia que seria utilizada por Van
Gennep, em 1909, para elaborar sua teoria dos "ritos de passagem", clássica no pensamento antropológico. Assim, poder-se-ia dizer que o tempo medieval era um tempo ritualcósmico.
Se o modelo das seis idades evocava a Criação, ele competia com outro modelo, o
das quatro idades do homem associadas às quatro estações do ano, aos quatro pontos
cardeais e aos quatro elementos da matéria segundo Aristóteles".
(...) "A Cidade de Deus é como que uma mediação entre uma concepção antiga,romana, voltada para o passado e outra, nova, voltada para o futuro e para a revelação divina".

CALAVIA, Oscar. 2002. Las formas locales de la vida religiosa. Antropología e historia de los santuarios de La Rioja. Madrid: Consejo Superior de Inve

A memória em questão: uma perspectiva histórico-cultural (Ana Luiza Bustamante Smolka)

Santos que não são santos (maria aparecida Junqueira Veiga Gaeta)

OS “SANTOS” LOCAIS E A COMPAIXÃO POPULAR

A espiritualidade monástica do século XIII: iconografia

A ética da polaridade de Ramon Llull (1232-1316): o conhecimento necessário dos vícios e virtudes para o bom cumprimento do corpo social

A viagem na idade média e imaginário clerical do paraíso

"O século XIII irá trazer grandes modificações a este panorama, invertendo-se a tendência histórica do Ocidente como civilização rural e continental, com o início do seu processo de expansão territorial; no quadro desta mutação e com o acesso às novas informações que ela implicou, a concepção latina de espaço perde força e viaja-se sobretudo por motivos ligados a interesses económicos ou clericais.
Com essas viagens, surgem relatos que podem ser agrupados em três grandes grupos de textos, nos quais é possível identificar os motivos principais do respectivo imaginário: o dos mareantes, mercadores e populações urbanas (de que o Livro de Nicolau Venetto ou o Livro de Marco Polo são exemplo), o dos nobres e o dos clérigos e dos letrados. Estas narrativas de viagem medievais distribuem-se, pois, por diferentes quadrantes e encontram-se ligadas a diferentes motivações mas, no geral, são um terreno de exploração difícil, suscitando problemas no que se refere ás suas origens, variantes, recepção, transformação e mesmo significação. No entanto, todas parecem implicar verdadeiros códigos de conduta, explicitando modelos de comportamento e construindo paradigmas de virtude, cristalizados nos seus heróis.
Em termos do imaginário clerical, é possível encontrar uma literatura hagiográfica constituída por relatos de vidas de santos e de peregrinações. Estas últimas, como prática cultural que se sobrepunha à vida terrestre, exprimiam a inutilidade deste mundo, constituindo-se como uma procura e uma demanda.
Intimamente ligada a esta última vertente da hagiografia, a viagem imaginária vai surgir fundamentalmente como uma interrogação sobre o universo, como uma tentativa de apropriação de ideais e palavras que levam à reconstrução verbal de um espaço mítico, de um espaço de substituição relativamente a um mundo tido por conhecido e comum ao leitor e ao autor. Pelo conjunto de conhecimentos na base dos quais se constrói, propõe um verdadeiro itinerário intelectual, constituindo-se como um percurso iniciático.
A literatura visionária da Idade Média apresenta um conjunto de texto em que a viagem imaginária surge essencialmente conotada com a procura de conhecimento espiritual, como uma metáfora sobre a procura de conhecimento. Nestas viagens, o importante é o significado simbólico, numa época em que a própria realidade era entendida como uma hierofania. É comum a estes textos o estabelecimento de um espaço diferente do humano e imperfeito e a denotação do desejo de ascensão a um espaço de felicidade, que seja o prémio do homem justo. Trata-se de um tema universal e a construção desses espaços opera-se a partir de elementos da realidade que cerca o homem e de arquétipos conotados com a felicidade almejada".

A visão final desejada: o paraíso terreal - O conto de Santo Amaro
"A ordem de Cister foi a renovação da de S. Bento7 e a vida claustral destes monges era baseada na disciplina, na austeridade e no colectivo quotidiano; as suas principais ocupações consistiam na oração e no trabalho manual, incluindo-se nele a obrigação de efectuar "treslados". Foi este o contexto em que surgiram os fecundos scriptoria medievais, devendo os monges dedicar-se igualmente ao estudo de livros sagrados, patrísticos e de edificação religiosa. São numerosos os textos que dão conta dessa infatigável actividade de escrita, alguns impressos nas primeiras décadas do século XVI, mas remetendo para uma escrita bastante anterior. Todos eles surgem associados a uma certa forma de pedagogia religiosa e cristã, mas que não exclui uma vertente social, como já houve oportunidade de referir. Para além do Conto de Amaro, poder-se-ão citar como exemplos a Regra de São Bento, a Vida de Santo Aleixo, Santa Maria Egipcíaca, História do Cavaleiro Túndalo, o Boosco Delleytoso Sollittario, Vida e Milagres de Santa Isabel, Vergel de Consolaçam, entre muitos outros.
Muitos destes textos são considerados de qualidade literária8, não obstante a sua funcionalidade específica e declarada. Constituem códigos de uma moral estrita, de acordo com os modelos de religiosidade da época e surgem, simultaneamente, como veículos e repositórios de um sistema de valores e de categorias culturais, definidores da mentalidade e sensibilidade medievais, como modelos de acesso e convivência com o Sagrado. Os valores que neles ressaltam são a pobreza, a obediência, a castidade, a abstinência, o respeito pelas hierarquias, a temperança, consubstanciados em prédicas, exortações ou exempla, em pequenas histórias ou contos exemplares, como no caso do Conto de Amaro. O símbolo e a alegoria são igualmente outro registo dessa função pedagógica: efectivamente, o sincretismo de sistemas, o progressivo desvanecimento de determinados valores e a ascensão de uma mentalidade enformada por valores cristãos, encontram no milagre, no exemplum, no símbolo e na alegoria os modelos preferenciais para a fixação de sistemas e categorias.
No geral, estes textos apresentam como característica a oscilação entre o fantástico e o maravilhoso, sendo a narrativa o seu modelo privilegiado de discurso. Apesar disso, a prosa hagiográfica recolhida nas maiores colectâneas medievais portuguesas9 apresenta poucos relatos de visões do Paraíso (o que não se verifica na bibliografia hispânica do mesmo período, quer em latim, quer em espanhol10); nessas compilações, nas quais se encontram cerca de duas centenas de narrativas de vidas de santos, só três apresentam esse género de relato: a de S. Patrício, a de S. Barlaão e a de S. Amaro".

Campos do imaginário de Gilbert Duran

Santos antigos: santificação ou canonização?

Legendae, Vitae, Flores: formas e conteúdos da hagiografia em Portugal na Época Moderna

"O Agiologio Lusitano de Jorge Cardoso é um dos grandes monumentos da cultura portuguesa do século XVII. Elaborado com o intuito confessado de inventariai todas as “vidas” de santos, beatos, veneráveis, “varões” e mulheres “ilustres em virtude” de “Portugal e suas conquistas” que o tempo ia deixando “sepultadas no esquecimento”, este Agiologio apresentou-se também como uma obra que pretendia elogiar os “santos da Pátria” para que os portugueses tivessem a quem imitar e os “Pátria de Santos”, ou seja para que os portugueses tivessem a quem imitar e os “estrangeiros” vissem – em que datas muito significativas... – que Portugal era uma “Pátria de santos”, ou seja para que a “santidade” fosse também um signo identificador da “Pátria”. Apesar de esta obra ter ficado incompleta – só foi parcialmente continuada no século XVIII por D. António Caetano de Sousa – do imenso trabalho do seu autor resultou, com se pretende mostrar neste estudo, uma obra de consulta imprescindível para o estudo não só do fenómeno da santidade em Portugal até ao século XVII, mas também múltiplas outras facetas da vida religiosa, social e até política desses tempos.

GER ******

HAGIOGRAFIA II. TRAYECTORIA HISTORICO-BIBLIOGRÁFICA.

Relíquias e corpo

"... a datação da “invenção” das relíquias é consensual: os documentos escritos são relativamente claros, apontando o ano de 1279 para o “nascimento” do corpo cultuado".

LEME USP/UNICAMP

ALMEIDA, Néri de Barros. "Palavra de púlpito e erudição no século XIII. A Legenda aurea de Jacopo de Varazze", Revista Brasileira de História, São Paulo.
ALMEIDA, Néri de Barros. "Hagiografia e literatura: notas sobre oralidade e escrita no textos eclesiásticos medievais", Margem, 12, pp.151-160, 2001.

Andréia Cristina Lopes Frazão da Silva/ufrj

HOMEPAGE PESSOAL
UFRJ PESQUISA VIDA DOS SANTOS E BEATOS *****
PROGRAMA DE ESTUDOS MEDIEVAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA COMPARADA 2007
http://br.groups.yahoo.com/group/PEM_projeto/message/86

"“Esse conjunto de informações pode gerar uma série enorme de monografias, dissertações de mestrado e teses de doutorado e servirá de material de consulta para outras áreas, como estudos em História da Arte, Teologia e Literatura”, explica Frazão".

Estudo do IFCS ressalta santos que fugiam aos padrões hegemônicos da Igreja

"“Nós buscamos analisar as tendências ligadas às santidades, mas ressaltando as particularidades, para mostrar o que elas revelam sobre os conflitos presentes na Igreja e na sociedade. Também estamos procurando lançar questões novas, usando os textos religiosos para analisar temas como as percepções sobre o corpo, a sexualidade e o tempo e as construções de gênero, entre outras vertentes ainda não exploradas”, explica Frazão".

Hagiografia
"Os textos hagiográficos não só apresentam diferenças formais, como também incorporam concepções diferenciadas de santidade. Vauchez, um dos mais importantes estudiosos europeus sobre a RELIGIÃO E RELIGIOSIDADE medievais, demonstrou como no decorrer da Idade Média foram se transformando os ideais de espiritualidade e, por extensão, as concepções de santidade e a própria hagiografia.
Baños Vallejo, seguindo a perspectiva literária e o método histórico-descritivo-comparativo (LITERATURA E HISTÓRIA), concluiu que existiu um gênero hagiográfico na Idade Média e que este se distinguia não pela forma dos textos, mas por seu conteúdo. Para este autor, seriam traços comuns dos textos hagiográficos medievais a apresentação de três elementos fundamentais: as ações realizadas em vida pelo santo e que retratam o seu desejo pela santidade, a morte vista como processo de aperfeiçoamento e, finalmente, os milagres post-mortem, como sinal do êxito e comprovação da santidade desejada pelo santo. Faz-se importante também ressaltar que os textos hagiográficos não eram considerados textos canônicos ou teológicos, mas obras com caráter festivo, que objetivavam comemorar a vitória do santo contra o mal, o diabo e a morte. É por isto que as hagiografias eram lidas nas festas, nos refeitórios monásticos, nas escolas e em locais públicos, como praças.
Muitos autores consideram a hagiografia como um tipo específico de texto literário, próximo à ficção, e não um texto de história. Como assinala Carbonell, "... o próprio facto de tal literatura ser designada pelo termo, tornado pejorativo entre os historiadores, de hagiografia, pode fazer crer que já não se trata de história". Porém, como assinala Leclerq, os homens da Idade Média, ao escreverem sobre santos, acreditavam estar fazendo História".


A obra de Gonzalo de Berceo (poemas)
" O objetivo deste trabalho é apresentar e discutir como gonzalo de Berceo, poeta e clérigo secular castelhano, que viveu na primeira metade do século XIII, retratou Santiago em suas obras. Esta questão ganha especial relevância face ao fato que este autor produziu seus poemas para estimular as peregrinações a um centro rival a Compostela: o mosteiro de San Millán de la Cogolla".



Gênero e descrições corporais na hagiografia mediterrânica no século XIII - um estudo comparativo
"... visão hegemônica no Ocidente medieval sobre os sexos. Como o trabalho de Thomas Laqueur demonstrou,[4] os intelectuais medievais consideravam que homens e mulheres eram duas variedades de um mesmo sexo. Tinham a mesma genitália, só que a dos homens ficava fora do corpo e a das mulheres dentro. E isto acontecia porque homens e mulheres eram classificados não como espécies diferentes, mas “conforme seu grau de perfeição metafísica, seu calor vital, ao longo de um eixo cuja causa final era masculina”.[5] Ou seja, os corpos dos homens eram considerados o padrão ideal e as mulheres vistas como produtos incompletos, a meio caminho da perfeição.
As questões levantadas a partir da leitura o trabalho de Marcos-Marin foram integradas a uma pesquisa mais ampla, intitulada Santidade e Gênero na hagiografia mediterrânica do século XIII: um estudo comparativo, em desenvolvimento com o apoio financeiro do CNPq. Nosso principal objetivo nesta investigação é analisar as obras redigidas por dois contemporâneos: a Vida de Santo Domingo de Silos (VSD) e Vida de Santa Oria (VSO)de Gonzalo de Berceo, e Vida I (1Cel), Vida II (2 Cel) e Legenda de Santa Clara (LSC) de Tomás de Celano, relacionando-as com o espaço de produção dessas obras, a formação intelectual e a inserção na Igreja de seus autores e os discursos de gênero, à luz dos seguintes aspectos: as mudanças nas concepções de santidade verificadas entre os séculos XII – XIIII no Ocidente; a propagação, no século XIII, do projeto de sociedade idealizado pela Igreja sob a liderança papal; o crescimento da vida religiosa feminina; a sistematização do pensamento misógino eclesiástico ocidental neste mesmo período".

Como morrem os santos
"O presente trabalho, portanto, busca estudar como Gonzalo de Berceo, ao narrar o falecimento dos santos que biografa, introduz o gênero à significação da morte. Interessa-nos analisar e explicar a construção que este poeta elabora do feminino e do masculino face à morte, apontando para a historicidade e as inconstâncias desta representação. Não estamos preocupados em reconstruir como e porque os santos morreram, mas os sentidos atribuídos pelo poeta medieval à estas mortes".


Reflexões sobre o uso da categoria gênero nos estudos de História Medieval no
Brasil (1990-2003)

O corpo dos pecados: as representações femininas nos reinos ibéricos.
Textos de História. Brasília, v.9, n.1/2, p.13 - 30, 2001; Outros olhares sobre a jograria
ibérica urbana. História Revista. Goiânia, v.5, n.1/2, p.71 - 88, 2000; Práticas mágicas nos
reinos ibéricos medievais. Estudos de História. Franca- SP, v.6, n. 2, p.11 - 22, 1999.


Memória e prática sacramental (ou memória do sacramento)
"O objetivo deste artigo é reconstruir a memória[6] e as práticas sacramentais,[7] resultantes da elaboração teológica, instituídas e observadas em La Rioja, região localizada no Reino de Castela e subordinada ao bispado de Calahorra, na primeira metade do século XIII, discutindo como estas funcionaram como estratégias para o controle social e fortalecimento da autoridade eclesial, através dos indícios encontrados nos cânones sinodais calagurritanos, texto de caráter normativo, e das vidas de santos redigidas por Gonzalo de Berceo, obras hagiográficas de caráter festivo, propagandista e pedagógico".

Hagiografia e História: um estudo comparativo sobre a santidade
"São objetivos desse projeto: 1- organizar bancos de dados contendo informações sobre os indivíduos considerados santos/beatos e sobre as hagiografias produzidas nas Penínsulas ibérica e itálica entre os séculos XI ao XIII; 2- elaborar uma tipologia das hagiografias produzidas e dos indivíduos considerados santos durante os séculos XI e XIII, nas Penínsulas ibérica e itálica; 3- , discutir o caráter didático e propagador das hagiografias; 4- comparar os textos das hagiografias inventariadas e o perfil dos indivíduos considerados santos com as normalizações eclesiásticas; 5- identificar e analisar, nas hagiografias em estudo e no banco de dados sobre as pessoas consideradas veneráveis, traços de crenças e práticas da religiosidade nos cultos aos santos que se difundiram nas Penínsulas Ibérica e Itálica dos séculos XI ao XIII; 6- relacionar a produção hagiográfica selecionada para análise com os programas de estudo e as preocupações dos centros intelectuais hispanos e italianos dos séculos XI ao XIII; 7- identificar e analisar os Discursos de Gênero presentes nos textos hagiográficos inventariados e através do perfil das pessoas consideradas santas; 8- comparar o fenômeno da santidade nas penínsulas ibérica e itálica, e 9-propiciar a formação de pesquisadores no campo da hagiografia, em especial a referente ao Ocidente Mediterrânico na Idade Média Central."

Leila Rodrigues da Silva
Conteúdo Programático:
Unidade I: As Fontes Medievais: Uma Discussão Conceitual e Análise Tipológica
Unidade II: Uma Crônica: A Crônica de Idácio
Unidade ÏII: Uma História: Historia Gothorum de Isidoro de Sevilha
Unidade IV: Uma Ata Conciliar: O III Concílio de Toledo
Unidade V: Um Espelho de Príncipes: De Formula Vitae Honestae de Martinho de Braga
Unidade VI: Uma Hagiografia: Vida e Milagres de São Bento de Gregório Magno
Unidade VII: Uma Regra Monástica: A Regra dos Monges de Frutuoso de Braga
Unidade VIII: Um Sermão: Sermo de Cesário de Arles

Modelo de vir sanctus: Marcelo Bierzo

Hagiografia visigoda e imagem textual

Hagiografia e poder na sociedade ibérica medieval

São Lula

"A fase mais delicada é a segunda, a de “venerável”, para provar que Lula viveu de forma exemplar as virtudes cristãs ou que morreu em defesa da fé. O papa não vai acreditar na ladainha de que Lula não sabia de nada, que foi traído como Jesus, que mandou cortar na própria carne e apurar tudo. Seria pedir demais, né? Então, sem as virtudes, resta a segunda opção, a de que morreu em defesa da fé, em suplícios e martírios inimagináveis. É aí que eu entro. Crucificação é pouco. Lula merece martírio mais original.Assim, mergulhei na hagiografia merovíngia, carolíngea, hispano-visigoda, da Baixa Idade Média e agora tenho algumas sugestões para valorizar o suplício de Lula rumo à santidade martirológica. Por plebiscito, os brasileiros poderão escolher a melhor tortura. Pra começar, temos os martírios de Alexandria, onde Lula, antes de decapitado, pode ser surrado com bastões de madeira, vergas, chicotes, cintos de couro ou cordas. Antes de ser jogado aos leões, no Maracanã, Lula pode sofrer o suplício da Tebaida: ter o corpo dilacerado com cacos de louça ou ser amarrado ao alto por um pé e, por meio de roldanas, puxado pela cabeça para baixo, com o corpo inteiramente nu, oferecendo ao povo o mais humilhante, cruel e desumano dos espetáculos. Desde que, depois, aos leões, seja servido sal de fruta Eno para combater a indigestão... Fogueira também é bom, mas com esse aquecimento global, melhor não, né? Jogá-lo ao mar também não é boa idéia, pois que estas coisas bóiam... Que tal perfurar seus dedos com bambus ou jogar chumbo derretido nas costas, como faziam aos mártires de Ponto, na Ásia Menor? Santa Sinforosa foi esbofeteada, dependurada pelos cabelos e depois afogada com uma pedra amarrada ao pescoço. Apedrejado como são Máximo? Só se for com paralelepípedos... Degolado como foram Narsalo, Citino, Vetúrio, Aquilino, Letâncio, Genara, Generosa, Vestia e Donata? Sim, mas a canivete, né? A anciã Apolônia teve todos os dentes arrancados com murros e foi queimada viva. Serapião foi submetido a duros tormentos, quebraramlhe os ossos e finalmente lançaramno de cabeça do andar superior. Entre os sacrifícios ímpios e sacrílegos, tem um ótimo, a morte por assideração: bota-se o infeliz nu, durante a noite, no auge do inverno, sobre um reservatório gelado de água, até virar picolé de pinguim gripado. Pena não termos inverno... Mas temos árvores, como as que santificaram os ascetas Xiamuna e Gurias.Foram dependurados pelos braços e puxados cruelmente, das 9h às 14h. Quando os carnífices ficaram cansados, a solução foi mandálos ao “buraco escuro”, onde ficaram de agosto a meados de novembro.Santo que é santo aguenta os sofrimentos mais atrozes: o tonel das Danaides, a roda de Íxion, o rochedo de Sísifo e as caldeiras ferventes cujos tampos os algozes levantavam para ver as contorções dos supliciados".

Revista Hispanista: Bosch e Bruegel

Iconografia Cristã

História do Cristianismo - a Igreja Medieval

"A religiosidade popular do séc. XIII nasceu desse meio urbano em fase de maturação. Assim como a arte das catedrais e a cultura das universidades, mesclava elementos tradicionais e formas novas. O culto dos santos, característico da piedade medieval, foi impulsionado: cada cidade e, no seu interior, cada uma das corporações, tinha um ou mais patronos. Multiplicaram-se as imagens dos santos nas fachadas das catedrais e a Igreja, por meio das canonizações, acrescentou novos nomes à sua lista de santos tradicionais. Como nos séculos anteriores, o culto dos santos se estende às relíquias que deles se conservam e para as quais são construídos santuários especiais que atraíam muitos peregrinos. A peregrinação é outra forma devocional herdada do passado e que se mantém com o mesmo vigor. Mas, na impossibilidade de realizá-la, os fiéis se consolavam com uma peregrinação abreviada: a procissão. Roma, a Terra Santa e Santiago de Compostela continuam sendo os lugares mais concorridos. A eles acrescentaram-se outros, como Cantuária - local do martírio de São Tomás Becket - e o túmulo de São Francisco de Assis.
O culto de Maria, porém, foi o mais vivo e o que atraiu a sensibilidade religiosa dos fiéis. Ao lado das representações iconográficas herdadas da época romântica - Maria apresentada como rainha, em postura hierática - surgem outras, que se tornarão clássicas na iconografia renascentista: as Madonas, de grande doçura e naturalidade, portando ao colo o Menino Jesus. Ainda no séc. XIII são as formas de devoção tipicamente mariais, como a recitação do rosário, de extraordinária difusão popular".

Cadernos de Antropologia e Etnografia

Reflexões sobre a iconografia medieval hispana

Iconografia dos santos

http://www.fl.ul.pt/historia/programas2007/inconografia_LUA.pdf
http://www.fl.ul.pt/historia/programas2007/iconografia_AMR.pdf

Milagre Régio e Ciclo Legendário

"A crença na idéia de superioridade dos reis franceses, defendida por Jean Golein, era alimentada por seus contemporâneos. Isto ocorre devido à crença de que somente o rei da França era ungido, em sua sagração, pelo óleo santo, misturado ao bálsamo de uma Santa Ampola, trazida do céu por uma pomba branca, o Espírito Santo. No tempo em que todo o ciclo monárquico era constituído somente pela Santa Âmbula, esta era anunciada pela dinastia francesa com grande estardalhaço. Em princípios do século XIII, um rei francês orgulhava-se pelo fato de, entre todos os reis da terra, ser o único “a brilhar com o glorioso privilégio de receber a unção com um óleo enviado do céu”".

crença, cura, unção com o santo óleo, céu, figuras celestiais (pomba) - existe uma pedagogia aí, uma paisagem da taumaturgia.

quinta-feira, 29 de março de 2007

O PAPA - tarô de Marselha: um exemplo do arquétipo no meu cotidiano

Esse meu tarô de Marselha eu ganhei de 'graça' de um colega da pós, na isolada da Letras, da Vera Casanova na ufmg - a Vera é bem conhecida pela sua abordagem semiótica de imagem e texto sobre a literatura de viagem. Esse meu colega tinha acabado de dar uma 'aula' sobre a simbologia de Hermes no ocultismo e a origem do tarô. Foi até erudito, e eu o admirei muito - invejei - pela lábia e prodigiosa memória para significados de imagens e palavras. No ponto de ônibus, puxei papo com ele e do nada ele me ofereceu o tarô! Na hora eu estranhei, mas depois senti como se nada tivesse passado. Foi um ato gratuito, fiquei agradecida, e senti que um pedido meu tinha sido atendido. Agora eu podia olhar as imagens, os símbolos, a iconografia! Estava tudo mais próximo. A tradição estilística, icônica e histórica das imagens do tarô de Marselha. Acho que o nome dele é Humberto.
É engraçado, eu sempre topei com ele pela cidade. Na Savassi, no shopping, na farmácia, no cinema ... é o meu anjinho! O maguinho! Um dia ele puxou conversa comigo na Araújo, deu pra pegar o telefone dele enquanto nos despedíamos novamente no ponto de ônibus, mas não liguei. Depois disso vi ele de novo!
Tenho problemas com a autoridade, o PAI, o PAPA, o REI, o IMPERADOR, a relação com o PODER e o SABER, that's my question. Minhas emoções entram em pânico diante de figuras de autoridade. Problema: minha relação com o meu pai, o da vida real. E o outro, o interno, que é o que me leva pras nunvens!

foto (ao lado): Flávia

http://www.clubedotaro.com.br/site/m32_05_papa.asp

Origem do nome: Flávia


Chaves é cidade antiga. Foi fundada pelos romanos, em 78 AD, com o nome de Aquae Flaviae. A referência à água no nome original se deve ao fato de que a cidade é famosa por suas águas termais (aqui conhecidas como “caldas”). Depois dos romanos, ocuparam a cidade os suevos, os visigodos e os mouros. A cidade só passou a ser portuguesa com a criação do reino de Portugal, por Dom Afonso Henriques, e a reconquista das terras portuguesas que estavam nas mãos dos mouros. Há várias teorias para a transformação do nome “Aquae Flaviae” em “Chaves”. Segundo alguns, numa teoria que parece ser a mais geralmente aceita, “Chaves” é uma corruptela de “Flavia” / “Flavius” . Outros afirmam que Nuno Álvares Pareira, herói da batalha de Aljubarrota, nas guerras da reconquista, teria recebido na cidade as chaves do Norte de Portugal. Uma terceira teoria apela para o fato de que a cidade era murada, e que, como tal, só era aberta com Chaves...
Lembrança: o Mariante, professor de português do primeiro científico, foi o primeiro a me falar que Flávia vinha de Claves que significava 'chave'. Também me surpreendeu quando disse que o significado em latim era 'louro', 'dourado', e vinha de Flavius. Nunca esqueci. Guardei os nomes, mas não me lembrava da história que ele contara. Não me lembrava que Claves era uma cidade de Portugal e nem sabia que a 'chave da cidade' tinha um significado simbólico na Idade Média. Daí sua relação (segundo uma interpretação que li no tarô de Jung) com a autoridade papal e a do imperador, representada no símbolo gestual tridentino,da mão direita ostentando os três dedos -indicador, polegar e médio; os outros dois, recolhidos, guardariam/esconderiam a 'chave da cidade', cujo poder de abertura só era conferido ao rei ou ao papa, os únicos capazes de acessarem o seu segredo e lidarem com seus desígnios em caso de perigo.
"Quando Cristo deu o poder das chaves ao Apóstolo São Pedro, fazendo dele o chefe da Igreja, a pedra sobre a qual ia fundar a sua única Igreja, prometeu-lhe que as portas do inferno não prevaleceriam sobre ela, e que tudo o que Pedro ligasse na terra, seria ligado no céu, e o que ele desligasse na terra, seria desligado no céu.
Isto é, que Pedro, sempre que falasse, sobre fé e moral , para toda a Igreja, como o poder que Cristo lhe concedera , seria infalível". (http://montfort.org.br/index.php?secao=cartas&subsecao=papa&artigo=20040818102436&lang=bra). O livro "A Revelação dos Templários" tira Pedro e Paulo do pedestal e coloca o feminino em ascenção, reforçando o papel de Madalena e São Sebastião na história da cristandade, mais para o lado dos mistérios do que para o lado da religião Igreja. Descende deles toda uma simbologia que foi passada secretamente pelas mentes mais brilhantes das seitas herméticas, cabalísticas, passando pelos reis taumaturgos da França e chegando até as artes do Renascimento com destaque para as obras que resgatam o primitivismo cristão em enigmas que hoje conhecemos exemplarmente como código Da Vinci. Mas, temos uma série de artistas aí nessa rabeira!

"Legenda Aurea": as virtudes e a vida exemplar dos santos

http://www.pem.ifcs.ufrj.br/Martires.pdf

".... os textos literários relativos aos santos, forma de perpetuar a memória destes homens e mulheres, são construídos de acordo com estereótipos narrativos que formam um personagem dado. Nesse tipo de literatura encontramos vários traços comuns e até mesmo eventos semelhantes. Mais importante do que o nome do santo é o modelo construído.
Nas hagiografias, o objetivo primário do autor não é compor um relato biográfico do santo, mas antes retratá-lo como exemplo de virtude cristã. Hagiógrafos também procuravam mostrar como os santos tinham imitado tais normas, particularmente aquelas estabelecidas pela vida de Cristo e de outros santos. Assim como os religiosos encorajavam sua audiência a imitar o exemplo dos santos, também pregavam os modelos literários oferecidos pela Bíblia e por obras hagiográficas anteriores, boa parte delas ainda da antiguidade. Estórias, temas, e motifs, eram repetidas de uma vida de santo a outra, e cada hagiógrafo adaptava o seu reservatório de material tradicional às necessidades da narrativa que tinha em mãos. O efeito, sem dúvida intencional, era, em parte, enquadrar a particularidade de uma vida de santo dada em um tipo generalizado de santidade, tais como a mártir, a virgem ou o santo bispo. Esse uso de modelos ajudava no propósito moral e didático das hagiografias.
Contudo, não podemos nos deixar levar por esse caráter tradicional da hagiografia. Os modelos
de santidade
mudavam consideravelmente através dos tempos, conforme o uso que cada novo autor fazia deles, desta forma alterando a tradição existente (DUBY, 1988, p.94.). Assim, mesmo sendo inconsistentes no que se refere à dimensão histórico-biográfica, personagens como São Jorge, Santa Catarina de Alexandria e outros se tornaram figuras importantes da devoção cristã medieval, justamente devido à produção hagiográfica sempre renovada de acordo com a mudança das exigências culturais, eclesiásticas e políticas. O santo mártir antigo continuará vivo na literatura e no culto, permanecendo firme como um modelo (BOESCH GAJANO, 2002, p. 455.).
Indubitavelmente a produção hagiográfica medieval apresenta traços peculiares que a distancia,
inclusive nas obras dedicadas aos mártires antigos, das primeiras atas escritas sob o signo da perseguição, nas quais, geralmente, não havia lugar para detalhes biográficos nem prodígios. É assim que ocorrerá a substituição de uma literatura utópica, expressão de uma minoria perseguida, pela literatura ideológica a serviço de uma Igreja que, ao converter-se na Idade Média em elemento fundamental do poder, tende a manter o sistema de valores. Não obstante, o santo, como herói épico, por suas qualidades místicas e sobre-humanas, pode chegar a enfrentar-se com a ordem social existente e desafiar a hierarquia instituída.
Evidentemente, a passagem da forma literária das Atas às Vitae não se dá bruscamente. Destarte, entre os séculos V e VIII, os elementos biográficos se incorporam também aos relatos de tema martirial, dando lugar a diversos tipos de paixões (BAÑOS VALLEJO, 1989, p. 39.). Reparando sobre a evolução entre as primeiras atas dos mártires e a hagiografia merovíngia, carolíngia e hispano-visigoda, Baños Vallejo conclui que estas constituem o autêntico precedente da hagiografia medieval. Possivelmente a demanda de textos hagiográficos provocou a necessidade de se recorrer a fórmulas e esquemas. Dentro da tendência assinalada, multiplicaram-se os milagres, pois cada vez se identifica mais a santidade com a taumaturgia".
O artigo “A Legenda Áurea e o Exemplum”, p. 66. Publicado. na Preá nº 3, assinado pelo professor João da Mata Costa.

Paisagens, territórios e pedagogia da memória (Maria do Céu Diel de Oliveira)

Estou fazendo essa isolada (quadro de disciplinas isoladas 2007 - eba/ufmg).


Autor:
OLIVEIRA, MARIA DO CÉU DIEL DE
Título:
A GRAVURA E O PROCESSO DE CRIAÇÃO DA IMAGEM
Notas:
BBE v. 41, n. 1, 1996. Dissertação (mestrado em Educação), INEP

Padre Antônio Ribeiro Pinto: o milagreiro de Urucânia

Fotos: Flávia
Túmulo com os restos mortais de padre Antônio de Urucânia Localização: Santuário de Nossa Senhora das Graças

Estive em Urucânia a serviço da Miguilim pra fazer umas fichas de inventário da festa da Romaria de Nossa Senhora das Graças, que acontece no dia 27 de novembro. Acordei às 5 horas da manhã pra tirar essas fotos no Santuário, com medo de (já pela manhã) encontrar a capela de velas apinhada de gente . Exagero meu, excesso de precaução e preocupação, marinheira de primeira viagem, como quiserem ... o fato é que não era preciso tanto! Ainda estava escuro! Eu podia ter dormido mais um pouco!
Bom, essas reproduções de fotografias ficam emolduradas nas paredes de azulejo da capela de velas (foto abaixo) dedicada aos pedidos feitos à Nossa Senhora das Graças, sob o intermédio das bençãos do padre de Urucânia, o divulgador de sua devoção. Essa Nossa Senhora é aquela primeira que foi levada para o Santuário, e lá esteve por anos, sendo celebrada ... onde estará? Atualmente há uma outra imagem seriada que é carregada na procissão de benção no dia da romaria.


"O que pretendemos realizar neste ano de 1967 é terminar o fundo do Santuário, onde futuramente será de um lado a Sacristia e do outro, provavelmente uma sala. Aos 9 de abril, aniversário de ordenação sacerdotal do Revmo. Pe. Antônio Ribeiro Pinto, a imagem de Nossa Senhora das Graças, por ele benta, será levada solenemente para o Santuário, ficando na parte que está terminada em um trono provisório". Trecho do livro de Margarida Drumond de Assis: Padre Antônio de Urucânia e sua benção".

A Construção do Santuário:
"Pe. Antônio deixou exarado em 01/05/60: 'Como ponto final de minha humilde obra no mundo, estou vivamente empenhado na construção do Santuário de Nossa Senhora das Graças em Urucânia, para o que apelo para os seus devotos, que assim retribuirão um pouco do muito que Ela tem dispensado ao Brasil e à humanidade". Nota afixada no mural do Museu Padre Antônio Ribeiro Pinto.



Foto: tirada do livro de Margarida Drumond de Assis, "Padre Antônio de Urucânia e sua benção".



veio passando pela cabeça:
o caso de Urucânia já é mais dentro desse quadro que atinge as pequenas cidades interioranas à margem dos processos de urbanização desenvolvimentista, em meados do século XX, já na sociedade de mercado capitalista periférico consumista pós-industrial consolidada. É um sacerdote que gera conflito no seio da ortodoxia da Igreja e que é duramente incorporado por ela. Ruim com ele, pior sem ele. Ele é mártir pras camadas populares. Tira o brilho mesmo de Nossa Senhora, mas como é adorador dela fica sendo aceito por pura conveniência. Aliás é o culto mariano que faz sua fama, é uma relação de mão dupla. Afinal o que seria do Pe. Antônio se não existisse Maria? Os devotos continuariam a ir lá? Saberiam da sua existência? Precisou ele falar no nome de Nossa Senhora pra ganhar o lugar de seu 'facilitador''/mensageiro. Mas, não toma o lugar dela. É ela que intercede em nome de Deus pela causa pedida . É fama de milagreiro que ele tem. 'Não é ele que faz o milagre' - isso é o que a Igreja quer entender e se fazer crer, mas tem muita gente que acha que é! E aí como é que a gente fica?
Como acha que é? Fica tocando nas coisas dele, reza é pra ele, conta os milagres dele, manda carta pra ele, presentes ... e aí? É Nossa Senhora? É pra ela isso tudo? Mas tem pra ela também, espera aí! Não carregam o andor na procissão? Não vão à missa participar de certas partes da liturgia? Ficam o dia todo celebrando os Sacramentos do Santíssimo! Tudo bem que no meio da missa vira uma bagunça, uma zoeira, um vozerio, uma passação de gente pra tudo que é lado, uma cantoria desgraçada, um negócio de testemunhar lá na frente no lugar do padre milagres alcançados, uma ladainha danada na frente da santa, uma tocação na imagem dela, beijação de pano, negócio de ficar mandando bilhetinho, rezar baixinho, vestir os meninos com as roupas dela, nas mesmas cores e adereços - que sacanagem com os anjinhos, tem uns até que vão de shortinho, mas tem outros que nem isso, coitados! O tradicional que é acender vela, oferecer flor nos pés da santa, incenso, água benta pelo padre para passar onde é que for, o escapulário, o terço, a cruz, tudo isso fica pequeno no meio de tanta devoção carnal com a santidade.

Foi só eu subir no morro do santuário (na colina) que vi aquela imagem esquisita no meio da paisagem, no alto, contra o céu, parecendo assombração, fazendo o quê ali no nada, isolada, e um tanto de gente sentada, agachada por ali debaixo daquele altar ou andaime de cimento que sustenta a estátua de pedra-sabão de uns 20 metros de altura. Aquela gente apinhada, num silêncio danado, só muxoxando, passando o dedo nas contas, com dor no pescoço de tanto olhar para cima, as pernas doída de ficar agachado tanto tempo, e o dinheiro indo embora porque o pedido vai mais vezes. Fiquei mesmo espantada com umas cabeças que vi bem debaixo do andaime, postas no chão, parecendo macumba: o que que é issu, meu Deus? Eu queria saber, pra que que serve? De que que é feito? (cera, depois vi), é um ex-voto! Mas, ali? Quase que debaixo de chuva? ... que o tempo tava ruim ... ameaçando enlamear tudo. E o povo lá, rezando, em família, ou separado, uns com a bíblia aberta em oração, outros com a mão estendida em sinal de pedido com o terço caindo por entre os dedos, quase não balançando de tanto que o absorto estava tomado pelo pedido da graça, de olho apertado ou às vezes contemplativo. Era muito bilhete que ia depositando num arranjo de flor improvisado sobre a estrutura de ripa do andaime, com um balaio ali sempre esvaziado, pelo jeito, pra dar conta de tanto pedido. Pouco pra essa época nossa, agora; que antes, se rolasse bilhetinho na idade média, ia dar pra mais que a vista alcança. Tinha fitinha de mensagem piedosa, com nome de santo sendo distribuída por mendigo aleijado, e mulher pedinte na subida do caminho com turbante na cabeça, saia de pano velho, descalça, com a mão estendida direto parecendo cigana. Achei aquilo muito estranho! É realmente eu não estava acostumada. Era uma visão esquisita. Depois fiquei de saco cheio de ficar ali sem fazer nada, e o povo continuava, uns iam embora também, lá embaixo gente ainda subia.
É curioso que ele mesmo não recebeu nenhuma graça de Nossa Senhora, a não ser o dom de fazer chegar a ela por seu intermédio a graça requisitada por um devoto. Em agradecimento pela graça alcançada se oferece um ex-voto à santidade demiúrgica, mas a mensagem tem que sair direitinho com assinatura e digital do pedido pra não ter perigo de errar o endereço e a encomenda sair outra, mal interpretada, correndo o risco do pagador sair ainda com dívida. Tem que ser bem dada em nome de sacrifício. A fotografia nisso é hoje imbatível. E se o reforço do pedido feito não passar pela benção do padre não tem mais a mesma força, que a Nossa Senhora lá em cima é bem possível que não escute. Tem que ir por ele e do jeito certo, sem mentira. Dizem que age por meio dela. Não aconteceu com ele nenhum milagre como os que se ouvia falar na época da colônia em que se achavam as imagens nas grutas, florestas, rios e montanhas. Não tem um milagre fantástico desse tipo pra contar! É de outro tipo, em que ele é visto como vidente, capaz de premonição e é capaz de que se rogar praga é capaz de pegar, espécie de feitiçeiro, que advinha o que vai acontecer e dá o aviso pra o desavisado ter a chance de se safar. Muita gente que recebeu sua benção por imposição das mãos ou palavra sussurrada ,feito mágica, saiu de lá curada; ouviu conselho que era pra ter bom comportamento, não facilitar o caminho da descida e não cair no vício. Fez muito milagre à distância, sem contato com o agraciado, só com a força do pensamento e por meio dos pertences desse abençoados. De milagreiro vira vidente, demiurgo. Onde está a santidade tradicional? A prova do milagre divino? É aonde se diz que muito disso aí é crendice, superstição, conto do vigário, charlatanismo, sacrilégio, heresia, . No meio disso tudo, tem relatos engraçados, estórias sem pé nem cabeça, casos repetidos, que dizem já virou lenda, aparições ditas absurdas, ou pra outros mais um sinal de hierofania. É só mesmo a vontade dele, a oração dele, ele se pegar com Nossa Senhora no terço, e saudá-la nas suas bençãos e penitências, como seu servo, para ter a sua intercessão concedida, a ponto de dedicar-lhe um santuário. Ele é muito querido pelo povo pelo seu modo de vida à maneira dos santos mártires: uma vida de sofrimento do nascimento à morte: primeiro com a infância marcada pela diferença social de ser filho de escravo; depois em vida adulta pelas expulsões que sofreu dos lugares por que passou, sendo perseguido pelas autoridades eclesiásticas e dogmáticas, sofreu também tentações da carne como o vício da bebida, contra que sua retidão conseguiu domá-lo; e, enfim, na morte foi testado pela doença, resignando-se ao seu destino na certeza de que os padecimentos do corpo na terra são sinal de força do espírito.


Fotos e texto: Flávia
















Fetiche por livros I - meus livros ficam guardados em malas. Ainda não criei vergonha de construir uma estante. Abaixo, alguns prediletos. Clássicos?





Fotos: Flávia
Sim, mas me refresco com iniciativas irreverentes. Aliás, está na hora de me desafiar com um bem diferente CONTEMPORÂNEO!